
Respeito
Todos falamos nele.
Com pompa e circunstância, de peito cheio e regozijo no rosto.
Respeito pela liberdade, respeito pela opinião, pelas opções, pelo modo de vida, pelo trabalho, pelos direitos, pelo Outro.
Respeito e mais respeito.
E, respeitosamente, teimamos em desrespeitar.
Se olharmos apenas para os poucos exemplos que aqui foram mencionados, constatamos facilmente o seguinte:
Desrespeitamos a liberdade alheia de cada vez que queremos impor a nossa, nomeadamente, porque achamos que somos o centro do mundo. Por essa razão, queremos ver a nossa liberdade respeitada e depois, com o que sobrar, lá respeitaremos a do Outro.
Desrespeitamos a opinião alheia de cada vez que levantamos a voz para que se faça ouvir a nossa, de cada vez que queremos – como diria Saramago – colonizar o pensamento e a opinião daqueles que estão à nossa volta.
Todos dizemos que respeitamos as opções de vida de cada um. Exemplo mais evidente disso é quando falamos de sexualidade. Todos respeitamos as opções sexuais, mas, invariavelmente, acabamos por fazer comentários jocosos e depreciativos sobre a sexualidade alheia. Somos todos a favor da homossexualidade, desde que não nos pretendam seduzir ou desde que a dita não afecte os nossos filhos. À parte disso, está tudo bem. O que fazem ou deixam de fazer é lá com “eles e elas”.
No que concerne ao modo de vida, somos todos a favor de que cada um deve viver a vida como mais lhe dá prazer, mas depois dizemos coisas como: “olha aquela anda com todos”, “aquele não quer trabalhar”, “o outro só pensa em comer”, “a outra só quer esbanjar dinheiro”, “fulano gasta o que tem e o que não tem em tabaco”, “sicrana anda sempre com as mesmas roupas”. E, de opção em opção, lá vamos desrespeitando.
Os senhores que varrem as ruas são dignos do nosso respeito, as senhoras que limpam as casas de banho também. São pessoas dignas e o seu trabalho é muito importante para a sociedade. Mas depois, atiramos o papel para o chão e a beata do cigarro e o cócó do cão. Na casa de banho, urinamos na tampa e não limpamos a sanita com o piaçaba porque dá muito trabalho.
Afinal, e como dizem alguns génios, se não fossemos porcos, como teriam essas pessoas um trabalho para poderem sustentar as suas vidas?
Ainda temos o respeito pelos direitos, desde que os nossos venham primeiro. Todos têm direito à habitação, desde que não seja em nossa casa, todos têm direito a um emprego digno, desde que não seja na nossa empresa, todos têm direito a defesa perante um tribunal, desde que tenham dinheiro e não nos peçam emprestado, todos têm direito a ter na mesa um prato de comida quente, desde que não falte na nossa.
E tudo isto de resume à forma como vemos e tratamos o Outro. Com indiferença. Com desrespeito.
Continuamos a cair no erro de pensarmos que o respeito é uma relação de reciprocidade pura e dura.
Que só devemos respeitar se formos respeitados. Que primeiro terão de ser os Outros a respeitar-nos e a darem o primeiro passo, para que possamos corresponder-lhes de seguida.
Que têm de ser sempre os Outros a manifestarem boa-fé para que lhes possamos demonstrar a nossa.
A isto se chama egoísmo. Primeiro nós, depois o Outro.
Agora o/a caro/a leitor/a me dirá:
“O artigo não era sobre respeito?”
Na realidade era. Mas não é possível falarmos de respeito enquanto continuarmos a desrespeitar tudo e todos.
Não se fazem casas pelo telhado.
Dizer “obrigado”, “com licença”, “peço desculpa”, por exemplo, não são apenas regras básicas e absoletas da mais elementar boa educação. Faz parte da forma como respeitamos ou não o Outro.
Quando todos soubermos o que é o respeito, talvez possamos falar dele.
Por agora, caberá a cada um, se quiser, refletir sobre o que aqui foi dito já que de utopias e boas intenções estão o infernos cheios!
Deixe um comentário